Cientistas decifram genoma do bonobo, o grande macaco 'sexy'
Autor: Reinaldo José Lopes
Fonte: Folha.com
Assunto: Genética; DNA; Comportamento; Símios.
Famoso por viver em uma sociedade relativamente pacífica, dominada pelas fêmeas e na qual o sexo é tão comum quanto bater papo entre humanos, o bonobo ou chimpanzé-pigmeu (Pan paniscus) acaba de ter seu genoma (o conjunto do DNA) decodificado.
Os dados sobre o material genético da espécie estão em artigo na revista científica britânica "Nature". Apropriadamente, considerando que se trata de uma espécie matriarcal, o DNA usado no estudo foi "doado" por uma fêmea chamada Ulindi, que vive num zoológico da cidade alemã de Leipzig.
Michael Seres/Divulgação | ||
Fêmea de bonobo Ulindi, cujo genoma foi sequenciado por cientistas alemães |
A pesquisa foi coordenada por Kay Prüfer e seus colegas do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, na Alemanha. Os bonobos são a última espécie viva de grande macaco (grupo que inclui o homem e os primatas mais aparentados a ele) a ter seu DNA "soletrado" -- antes deles, além do próprio ser humano, os cientistas também já haviam obtido sequências bastante completas do genoma de chimpanzés comuns, gorilas e orangotangos.
A esperança dos cientistas é comparar essa multidão de dados para entender como cada espécie evoluiu e lançar luz sobre as características genéticas que nos tornaram humanos. O interesse pelos bonobos se justifica porque sua sociedade relativamente "do bem" é um contraponto mais do que bem-vindo aos chimpanzés comuns e aos próprios humanos.
Além do histórico de guerras e depredações do Homo sapiens, os próprios chimpanzés não primam pelo pacifismo, com casos reconhecidos de infanticídio, "raides" (guerras de pequena escala, similares às de caçadores-coletores humanos) e feroz disputa pelo poder entre machos. É difícil dizer categoricamente que tais coisas inexistem entre bonobos, até porque a espécie é relativamente pouco estudada na natureza, mas tudo indica que a frequência delas é muito menor.
Parte da explicação para isso talvez esteja justamente no uso constante do sexo como "diluidor" de tensões sociais e ferramenta para cimentar alianças, especialmente entre fêmeas. Sim: dotadas de clitóris extremamente avantajados, elas se entregam a relações homossexuais conhecidas informalmente como "hoka-hoka" e tecnicamente como "esfregamento gênito-genital". Machos também fazem sexo entre si com alguma frequência, e até filhotes entram na dança.
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Apesar do genoma decifrado, ainda é muito cedo para dizer como essas tendências emergiram e se há algum impacto delas na evolução humana, já que aparentemente estamos no meio do caminho entre bonobos e chimpanzés em termos de agressividade.
As primeiras pistas vindas do genoma, no entanto, indicam que 3% do total do nosso DNA é mais parecido com o dos chimpanzés ou o dos bonobos do que o DNA de cada um dos macacos se parece com o do outro primata não humano. E o mesmo vale para ao menos algum trecho de 25% dos nossos genes.
Curiosamente, a comparação dos três genomas -- de chimpanzé, de bonobo e o humano -- indica que todas as espécies sofreram a influência de pedaços móveis de DNA, os quais "saltam" de um trecho a outro do genoma, que tiveram efeito sobre o desenvolvimento dos neurônios. Especula-se que a evolução da complexidade do cérebro tenha a ver com esses "genes saltadores".
A pesquisa também indica que a separação entre bonobos e chimpanzés é muito recente em termos evolutivos: "só" 1 milhão de anos (para comparação, nós nos separamos da linhagem que daria origem às duas espécies há 6 milhões de anos).
Outro dado interessante, calculado com base na diversidade genética da espécie, indica que, ao longo da evolução dos bonobos, para cada macho que conseguia se reproduzir, duas fêmeas conseguiam deixar descendentes -- sinal, claro, de que alguns machos estavam se saindo melhor no jogo reprodutivo.
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